Uma das cenas mais marcantes do último final de semana foi a dificuldade de Lewis Hamilton ao sair de seu carro depois do quarto lugar no GP do Azerbaijão. Durante a corrida, a Mercedes do inglês batia com força no asfalto nos trechos de alta velocidade. Tanto que era possível ouvir os quiques na sua comunicação via rádio.
Ele não estava sozinho. Daniel Ricciardo também colocou as mãos na lombar tão logo saiu de sua McLaren. E era difícil encontrar algum piloto que não tivesse sentido pelo menos um pouco de desconforto ao pilotar. “Não é saudável, com certeza. Eu passei por fisioterapia antes e depois de todas as sessões porque meus discos vertebrais estão sofrendo. Precisamos de soluções para não acabarmos andando de bengala aos 30 anos”, disse Pierre Gasly, da AlphaTauri.
Esse é um problema que essa nova geração de carros vem enfrentando desde o começo do ano, mas em Baku estes quiques, chamados na categoria de “porpoising” (termo que pode ser traduzido como golfinhada, por se referir ao movimento de um tipo de golfinho), foram mais agressivos. Isso porque pistas de rua são naturalmente mais onduladas, e em Baku há uma longa reta, na qual o movimento piora.
O mesmo vai acontecer neste final de semana, no GP do Canadá, outro circuito de rua ondulado e com longas retas. Não que a Fórmula 1 ou as equipes não saibam como resolver o problema, que vem de um conjunto de fatores -o pneu de perfil baixo, a suspensão mais dura e a necessidade maior de gerar pressão aerodinâmica debaixo do assoalho, todas essas novidades para este ano. Há uma solução bem simples para o porpoising, que é andar com o carro mais distante do solo. Assim, o carro vai absorver o impacto que não consegue ser mitigado pelo pneu e pela suspensão, mas pelo menos não vai bater no asfalto. Na verdade, é normal que se use carros mais altos em circuitos de rua justamente por isso. Um assoalho menos flexível também ajuda.
“Todas as equipes sabem como parar o porpoising imediatamente”, admitiu o chefe da McLaren, Andreas Seidl. “Mas como é uma competição, faz sentido analisar como um todo e seguir no melhor caminho para o esporte.”
Em outras palavras, ninguém quer levantar o carro porque isso tira performance do carro. Então os próprios pilotos estão sendo colocados em uma situação difícil. “A equipe me pergunta ‘podemos comprometer o acerto?’ e eu estou comprometendo minha saúde pela performance. Sempre farei isso, sempre tentarei ter o carro mais veloz que puder. Mas não acho que a FIA deveria nos colocar nessa posição de ter de escolher entre a saúde e a performance”, disse Gasly.
A preocupação é grande entre os pilotos mais jovens porque eles sabem que o regulamento não será alterado, pelo menos, até 2026. Ou seja, eles teriam de conviver com isso por perto de uma centena de corridas e temem sofrer efeitos negativos a médio e longo prazo. O primeiro a levantar a bola publicamente foi Carlos Sainz, da Ferrari. E os pilotos já pediram em reuniões com a direção de prova que a FIA intervenha.
SEGURANÇA OU PERFORMANCE?
A Federação chegou a fazer uma proposta com uma série de medidas que, na prática, resultariam em uma altura mínima para os carros. Porém, para mudar o regulamento, seriam necessários, pelo menos, 8 votos entre as 10 equipes, e este número dificilmente será atingido.
Isso porque o porpoising não é visto em todos os carros, muito menos é sentido na mesma intensidade. Então equipes como a Red Bull são contra uma mudança. “Eles podem colocar uma placa mais dura no carro se quiserem, ou a solução mais fácil seria andar com o carro mais alto. É injusto punir quem fez um bom trabalho”, apontou Christian Horner.
As imagens onboard da Red Bull mostram o movimento, mesmo que ele seja bem mais sutil que em outros rivais. O britânico admite que a FIA deveria intervir se o porpoising fosse uma “preocupação genuína pela segurança em várias equipes do grid, mas é algo que está afetando equipes isoladas.”
É fato que a equipe que mais fala em porpoising é a Mercedes, que também tem os movimentos mais violentos. Mas Baku mostrou que eles também estão tentando andar com o carro mais baixo que a Red Bull, por exemplo, e com um assoalho mais flexível, o que também gera ainda mais movimento. Horner sabe que, para fazer o conceito inovador do sidepod zero funcionar, a Mercedes precisa andar com o carro bastante próximo do solo.
Então o que os pilotos veem como uma questão de saúde a longo prazo entra dentro da politicagem das equipes, que não querem dar nenhuma chance para os rivais. No meio de tudo isso, está a FIA. Para resolver o impasse, ou eles adotam uma proposta aceita por pelo menos oito times, ou determinam uma mudança por questões de segurança.
As negociações continuam e o que ninguém quer é ver um acidente acontecer antes de qualquer decisão. George Russell, da Mercedes, disse que o carro pulava tanto em Baku que ele mal conseguia julgar seus pontos de freada (declaração que Horner interpreta como uma instrução da Mercedes para criar a sensação de que os carros estão inseguros e forçar a FIA a agir unilateralmente). E neste fim de semana no Canadá, não deve ser diferente. Tanto com os quiques na pista como com a guerra de palavras fora dela.
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