No momento em que o país acaba de passar pelo mês mais letal da pandemia e especialistas já cogitam uma terceira onda de casos de Covid-19, o nível de isolamento dos brasileiros é o mais baixo desde o início das restrições impostas para conter a disseminação do coronavírus.
Pesquisa Datafolha mostra que três em cada dez brasileiros adultos (30%) estão totalmente isolados ou saem de casa somente quando inevitável. Esse percentual, que teve seu maior índice no início de abril de 2020, com 72%, era de 49% em março deste ano.
Desses 30%, 2% dizem não sair de casa sob hipótese alguma —uma queda de seis pontos percentuais em relação a março de 2021 (8%) e cifra bem distante dos 18% registrados em pesquisa de abril do ano passado, logo no início da pandemia.
Já os que declaram sair de casa somente quando inevitável somam 28%, bem abaixo dos 41% registrados na pesquisa de março passado, quando o país enfrentava o pico da segunda onda de Covid-19, com falta de leitos de UTI, oxigênio e medicamentos para intubação de pacientes.
No entanto 63% dos que dizem sair de casa para trabalhar e fazer outras atividades afirmam tomar cuidado. O índice é recorde desde o início da pandemia e um salto em relação a março último, quando esse grupo representava 47%.
Já 7% dos ouvidos na pesquisa afirmam viver normalmente, sem alterar a rotina em razão da Covid-19.
Para esse levantamento, o Datafolha realizou 2.071 entrevistas presenciais, entre os dias 11 e 12 de maio, em 146 municípios, com brasileiros de 16 anos ou mais, de todas as classes sociais e regiões do país. A margem de erro da pesquisa é de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos, com nível de confiança de 95%.
O isolamento total é majoritário entre os que têm mais de 60 anos (considerados grupo de risco para a Covid-19), com 4% de adesão. O índice, no entanto, é inferior ao de março, quando 12% dos entrevistados dessa faixa etária afirmavam não sair de casa. Entre as duas pesquisas, esse foi o grupo que mais se beneficiou com a campanha de vacinação contra a doença no país.
Já entre os que dizem sair de casa somente quando inevitável, é possível notar que a cautela está relacionada à idade. Na faixa etária de 16 a 24 anos, os que evitam sair somam 19% —número que chega a 49% entre os com mais de 60 anos.
A baixa adesão dos jovens ao isolamento social foi acompanhada de um aumento de casos e hospitalizações por Covid-19. Levantamento da Amib (Associação de Medicina Intensiva Brasileira) mostrou que o percentual de mortes de pacientes com idades entre 18 e 45 anos, internados em UTIs, pulou de 13,1%, entre setembro e novembro de 2020, para 38,5%, entre fevereiro e março deste ano.
No grupo dos que dizem sair de casa para trabalhar e realizar outras atividades, tomando cuidado (63%), os maiores índices foram notados entre os homens (68%, ante 58% das mulheres), nos que têm de 25 a 34 anos (72%), entre os com mais escolaridade (72% têm ensino superior) e entre os que possuem renda familiar de mais de dois a dez salários mínimos (70%).
Entre as ocupações, 84% dos trabalhadores assalariados, 82% dos assalariados sem registro e 79% dos empresários declaram fazer parte dessa parcela.
Já nos que afirmam estar saindo de casa normalmente, sem mudar nada na rotina, os maiores percentuais foram observados entre homens (11%, ante 4% das mulheres), nos que têm renda de mais de dez salários mínimos (10%) e entre os que sempre confiam nas falas do presidente Jair Bolsonaro (14%).
Consenso entre especialistas para frear um vírus transmitido principalmente por gotículas de saliva e aerossóis, o isolamento social vem sendo combatido pelo presidente desde o início da pandemia. Bolsonaro já usou as palavras "histeria" e "fantasia" para classificar a reação da população e da imprensa à doença.
Bolsonaro enalteceu o agronegócio, que o homenageara em um ato na Esplanada dos Ministérios no sábado (15). Ele disse que o homem do campo não parou durante a pandemia, garantindo alimentos para quem deixou de sair às ruas. "Se o campo tivesse ficado em casa, esse cara tinha morrido de fome, esse idiota tinha morrido de fome. Daí, ficam reclamando de tudo."
No ato de sábado, do alto de um caminhão de som, Bolsonaro havia voltado a ameaçar tomar medidas contra um eventual lockdown nos estados. “Não desafiamos ninguém, não queremos confronto com ninguém, mas não ousem confrontar ou roubar a liberdade do nosso povo."
Na semana passada, Bolsonaro tinha dito já ter pronto um decreto para proibir prefeitos e governadores de adotarem medidas restritivas de combate ao coronavírus, como toque de recolher e fechamento do comércio.
A declaração do presidente sobre o decreto é mais uma provocação ao STF (Supremo Tribunal Federal), que já deu aval para que estados e municípios tomem medidas nesse sentido no combate à Covid-19.
Festas são atividades mais inseguras
O Datafolha ainda avaliou a sensação de segurança dos brasileiros para a retomada de algumas atividades. Ir a festas é considerada a mais insegura delas. Somente 4% dos entrevistados afirmam se sentir muito seguros nesses locais. Outros 13% dizem se sentir pouco seguros, e 82%, nada seguros.
A ida a igrejas e templos religiosos é apontada como a atividade com menor risco de contaminação. Segundo a pesquisa, 18% se sentem muito seguros, 42% um pouco seguros e 39% nada seguros nesses espaços.
Em março, o presidente Bolsonaro incluiu as atividades religiosas no rol de serviços essenciais, que não devem ser suspensas mesmo durante as fases mais críticas da pandemia.
Já o fato de sair para trabalhar é avaliado como muito seguro para 14% dos participantes, pouco seguro para 53% e nada seguro para 31%.
Escolas e faculdades representam um ambiente muito seguro para 8% dos entrevistados, pouco seguro para 43% e nada seguro para 47%.
Questionados a respeito da abertura das escolas, 46% disseram que as unidades deveriam ficar fechadas durante toda a pandemia. Já 28% responderam que apoiam a abertura parcial, e 18%, o fechamento somente nas fases mais restritivas. Outros 7% disseram-se favoráveis à abertura sem restrições e 1% não soube opinar.
Projeto de lei que considera aulas presenciais de educação básica e superior como serviços e atividades essenciais foi aprovado pela Câmara dos Deputados em abril. O texto seguiu para o Senado e teve a votação adiada em 6 de maio, após aprovação de requerimento para realização de audiência pública sobre o tema.
O texto proíbe a suspensão de aulas presenciais, exceto quando as condições sanitárias de estados e municípios não permitam, em situação que deverá estar fundamentada em critérios técnicos e científicos. Nesse caso, a decisão deverá constar em ato do chefe do Executivo estadual ou municipal.
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